Paulo Freire. Revista de Pedagogía Crítica
Año 15, N° 18 Julio – Diciembre 2017
ISSN 0717 – 9065 ISSN ON LINE 0719 – 8019
pp. 153 - 176
UNA
EXPERIENCIA EMANCIPATORIA EN LA FORMACIÓN DE PROFESORES EN LA PREFECTURA DE SÃO
PAULO-BRASIL, ENTRE 2001 Y 2004
AN EMANCIPATORY EXPERIENCE IN TEACHER TRAINING -
PREFECTURA DE SÃO PAULO-BRASIL BETWEN 2001 AND 2004
Resumen.
Este artículo presenta una
experiencia de formación de profesores experimentada por una de las autoras,
entre 2001 y 2004, durante la actuación de Paulo Freire como Secretario de
Educación. En el presente relato, se busca establecer un diálogo entre el pensamiento
de Adorno y de Freire, con el fin de comprender la importancia y los límites
presentados por tal experiencia en la formación de maestros en servicio. En
este sentido, la experiencia busca demostrar cómo los caminos recorridos por la
Red de Educación Municipal de São Paulo durante este período, dieron lugar a
condiciones sustanciales para los formadores y profesores para crear
itinerarios de formación con mayor autonomía, lo que permitió la formación, de
un cierto grado, de autonomía en la toma de decisiones acerca de la
reformulación de los planes de estudio y las relaciones establecidas
tradicionalmente dentro de los contextos escolares, constituyendo posibilidades
reales de superar la tendencia histórica de los modelos prescriptivos que
ignoran la escuela y sus individuos en su concreción social.
Palabras claves: autonomía, emancipación,
formación del profesorado,
políticas educativas.
* Universidade Nove de Julho – Brasil; lupisaneschi@yahoo.com.br
** Universidade Nove de Julho – Brasil; vmcbrasil@hotmail.com. Fecha de Recepción: 30 junio 2017
Fecha de Aceptación: 30 noviembre 2017
Abstract.
This
article presents an experience of teacher training experienced by one of the
authors between 2001 and 2004 during the performance of Paulo Freire as
Secretary of Education. n the present narrative we try to establish a dialogue
between Adorno and Freire's thinking in order to understand the importance and
limits presented by such experience in the training of teachers in service. In
this context, the aim is to demonstrate how the paths covered by the Municipal
Education Network of São Paulo during this period gave rise to substantial
conditions for trainers and teachers to create training programs with greater autonomy. That allowed the formation of a certain degree
of autonomy in the decision making about the reformulation of the curricula and
the relationships established traditionally within the school contexts
constitute real possibilities to overcome the historical tendency of the
prescriptive models that ignore the school And their individuals in their
social concretion. To establish a dialogue between the thinking of Adorno and
de Freire in order to understand the importance and limits presented by such
experience in the training of teachers in service.
Key words: autonomy, emancipation, teacher training, educational
policies.
O presente trabalho apresenta uma experiência de formação docente vivenciada por uma das autoras[1] junto à Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, entre 2001 e 2004. Tendo como pressupostos teóricos as categorias de emancipação e autonomia, buscamos estabelecer um diálogo entre o pensamento de Paulo Freire e Theodor Adorno para compreender a experiência, verificando avanços e regressões que pode ter promovido.
As sociedades contemporâneas têm sido marcadas por diversas formas de enquadramento e adaptação cega às determinações
de diferentes setores sociais,
que, exercem uma ação sistemática de dominação. Essa lógica da “enformação”, alicerçadana homogeneidade e na heteronomia, está impregnada nos diferentes campos da nossa sociedade, inclusive a escola.
Carregada dessas contradições, a instituição escolar perpetua o modelo social excludente e alienante, reduzindo tudo e todos à lógica capitalista. Projeta-se na formação contínua de professores, especialmente a formação em serviço, que passa a ser reduzida a pacotes de capacitação, representando uma formação que nega o indivíduo, o adapta às necessidades do trabalho, desconsidera os contextos específicos da ação docente, gerando mecanismos de adestramento, adaptação “cega” aos modelos preestabelecidos, de modo a controlar o trabalho pela técnica, automatizando os processos, inclusive os espirituais (Adorno, T.W.; Horkheimer, M., 1985).
A experiência aqui relatada, situa-se numa perspectiva de promoção de mudanças nas políticas educacionais do Município de São Paulo, presentes desde a administração de 1989 a 1992, interrompida até 2000 com a pretensão de romper esse ciclo adaptativo na formação docente, retomado em 2001.
A prefeitura municipal de São Paulo, cidade que é capital do estado de São Paulo, possui uma das maiores e mais antigas redes de ensino municipais e geri todo o seu sistema de ensino com autonomia, concedida na Constituição da República de 1988, que delega aos municípios parte do Ensino Básico. Atende a creche (0 a 3 anos de idade, a pré-escola (até 6 anos de idade), Ensino Fundamental com nove anos de escolaridade e alguma demanda do Ensino Médio (três ou quatro anos) embora sem responsabilidade plena por esse atendimento. O ensino fundamental é universalizado em todo o território do município, num processo estabelecido desde os anos de 1980 e, no caso da pré- escola, a partir do início do século XXI.
As prefeituras, no contexto brasileiro, são responsáveis pelos primeiros anos do Ensino Fundamental e pela oportunidade educacional da primeira infância e a formação de professores, na qual este trabalho se enquadra, vem sendo um esforço constante para ampliar a educação como garantia de todos, na medida que toda a legislação civil e educacional implicam a educação como universal e os profissionais como elemento importante da qualidade. A administração local da cidade de São Paulo no período de realização da experiência relatada, encontrava-se sob um modelo de gestão democrática, que considerou a participação como um dos pilares para preparar os professores para uma ação que, reflexiva, impulsionasse uma qualidade na escola vocacionada para os problemas de cada localidade.
Apresentada a experiênciada ação formativa dos Grupos de Acompanhamento à Ação Educativa (GAAES), órgão da Secretaria de educação do Município, discute-se o papel da escola enquanto seu locus, detalhando a ampliação da autonomia e da emancipação docente, analisando limites/possibilidades e, finalmente, desenvolvendo reflexões, em torno da autonomia e emancipação, conceitos presentes em Paulo Freire e na Teoria Crítica, especialmente, Theodor Adorno.
1.1 - A formação em serviço
na construção de uma política educacional da rede municipal de ensino da cidade de São Paulo
entre 2001 e 2004.
Em 2001, assumiu a prefeitura de São Paulo um governo de tendência progressista, tendo, inicialmente, o professor Dr. Fernando José de Almeida como Secretário da Educação. O primeiro pronunciamento à Rede se deu por meio do documento EducAção nº 01 - Retomando a conversa: a construção da política educacional da Secretaria Municipal de Educação.
Como o próprio título sugeria, a intenção era retomar o trajeto iniciado em 1989, quando Paulo Freire foi secretário da educação no município, interrompido no início de 1993, quando Sólon Borges dos Reis assume a pasta e rompe com a proposta política-pedagógica democrática, instituindo um “modelo” alicerçado no princípio da qualidade total, orientado pelo controle, gerenciamento e padronização das ações nas escolas municipais.
Ao “retomar a conversa”, pretendia-se resgatar o princípio de uma escola pública e efetivamente democrática, tendo no diálogo o eixo, a partir do qual “a comunidade educativa, educadores, funcionários, pais, alunos da rede municipal” (São Paulo, 2001, p.4), poderiam participar do processo de construção de novos parâmetros de organização escolar, especialmente no que tange à gestão democrática e ao desenvolvimento curricular.
Diferentemente de outros documentos que regeram a organização da Rede na gestão anterior, com descritores e prescrições, o EducAção nº 01 propunha três princípios, a partir dos quais, o processo de reorganização curricular e, consequentemente, os percursos formativos dos profissionais da educação deveriam ser orientados:
1. Gestão Democrática;
2. Qualidade social da educação; e
3. Garantia de acesso
e permanência dos educandos no universo escolar.
No âmbito da formação docente, o documento sinalizou um processo de formação permanente, sistemático e em serviço, de modo a envolver todos os educadores num movimento formativo que considerasse a sua experiência, suas práticas e as relações na escola, problematizando-as para promover a autorreflexão no contexto real das escolas.
Atendendo aos sinais, as ações foram fundamentadas nos princípios expressos na obra de Paulo Freire (1979/2005), especialmente os da autonomia e os da emancipação, valorizando a formação docente no interior da instituição escolar. Na sequência, foi implantada a formação em serviço, uma experiência formativa dos Grupos de Acompanhamento da Ação Educativa (GAAEs)[2] com locus na escola, de modo a propiciar condições para que tanto formadores, quanto professores pudessem criar percursos mais autônomos, elevando o grau de emancipação docente na retomada da reelaboração dos currículos e na transformação das relações políticas no interior das escolas, valorizando a cada indivíduo, na concretude histórica de cada contexto escolar específico.
Esse grupo de profissionais, do município, reunia aqueles que haviam vivido o processo de “Reorientação Curricular”[3] durante a administração de Paulo Freire e Mario Sérgio Portella, entre 1989 e 1992 e novos profissionais, especialmente professores incorporados no grupo, em função da sua atuação na rede municipal em torno da preocupação de vincular a organização curricular à realidade social nas escolas. O foco do projeto pretendeu apostar num diagnóstico crítico do real, como baliza para a ação escolar.
Essa formação em serviço, fundamentada na mesma convicção da “Reorientação Curricular” de que quaisquer mudanças necessárias às instituições escolares, só é possível, se é realizada em conjunto com os indivíduos que compõem esses espaços institucionais, em um movimento que tome, como ponto de partida, as relações entre a realidade local e suas necessidades e, como ponto de chegada, o compromisso político com a emancipação. Uma participação fundada na ética política e profissional, tendo na análise crítica da prática seu objeto fundamental, conforme indica Freire:
A responsabilidade ética, política e profissional do ensinante lhe coloca o dever de se preparar, de se capacitar, de se formar antes mesmo de iniciar sua atividade docente. Esta atividade exige que sua preparação, sua capacitação, sua formação se torne processos permanentes. Sua experiência docente, se bem percebida e bem vivida, vai deixando claro que ela requer uma formação permanente do ensinante. Formação que se funda na análise crítica de sua prática. (Freire, 2001, p.59)
A construção da proposta de formação de professores em serviço foi sendo tecida juntamente comas escolas, num movimento dialógico entre as escolas em cada Núcleo de Ação Educativa (NAE)[4], discutindo, em conjunto com a sua equipe, a realidade das unidades, fazendo emergir um diagnóstico das demandas, preocupações e angústias dos docentes circundados pelos desafios e pelas particularidades de cada escola e sua realidade local.
Nesse movimento, surgiu a necessidade de criar estratégias de ações descentralizadas daquelas instâncias intermediárias responsáveis, entre outras atribuições, pela ação formativa em cada região.
Para viabilizar esse trabalho in loco, em 2002, foi criado um GAAE para cada grupo de escolas, constituído pelas equipes pedagógicas e de Supervisão do NAE. Os vários GAAEs foram assessorados diretamente por pesquisadores das principais Universidades da cidade, duas públicas, a Universidade de São Paulo e a Universidade Estadual de São Paulo, ambas geridas pelo governo do estado e uma universidade particular, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, de gestão católica.
Além disso, foram celebradas parcerias, também, com Universidades e pesquisadores de outros estados, de acordo com as demandas apresentadas e com os trabalhos desenvolvidos pelos diferentes pesquisadores[5], contando, assim, com a assessoria desses pesquisadores no processo de reflexão crítico- teórica acerca das demandas (explícitas e tácitas) apresentadas pelas escolas. O Núcleo de Ação Educativa, onde a experiência ocorreu, contava com 120 unidades escolares[6]. O GAAE considerou a formação em serviço, a principal ação crítico-política para retomar a reorientação curricular, combatendo o currículo como mera reprodução técnica de conteúdos. Composto por dois profissionais da Oficina Pedagógica e um supervisor escolar, acompanhou o trabalho de oito unidades escolares (inicialmente, agrupadas por proximidade e, no aprofundamento das discussões, pelos desafios que foram sendo sinalizados). Colocou o locus formativo na escola, local privilegiado para o exercício da práxis educacional e ambiente propício para a reflexão coletiva e a autorreflexão das principais demandas, e, possibilidades de respondê-las mediante encontros quinzenais ou mensais, que resultavam na sistematização de discussões e construção de pautas com participação de coordenadores e diretores.
Ancoradas na conquista da reestruturação da carreira dos quadros do magistério que a garantiu na prefeitura da cidade de São Paulo, desde 1992, a formação permanente e a formação em serviço (15 horas semanais) - o GAAE 6 - orientou-se por três eixos metodológicos:
1.
Estudo preliminar
da realidade (ER). Resgatando
o cotidiano das escolas, suas
concepções, práticas, relações cristalizadas, desvendando o currículo expresso e oculto, presente nas
falas dos profissionais como pano
de fundo para os debates. O estudo pressupôs a observação
sistemática do cotidiano escolar, bem como a autonomia na forma de realizá-lo e na interpretação dos dados levantados.
2.
Problematização das situações limites. Em um processo de análise crítica da realidade como
forma de denúncia e superação
do estabelecido, promoveu-
se a autorreflexão e a negociação
coletiva. Tal estudo pressupôs a observação sistemática do cotidiano escolar, bem como a autonomia na forma de realizá-lo e na interpretação dos dados
levantados, resgatando o cotidiano das escolas (presente nas falas dos profissionais como
pano de fundo para os debates), suas concepções, práticas, relações cristalizadas. Com isso, desvendou-se o currículo expresso e oculto. Essa dimensão analítica, permeada por tensões
que favoreceram relações
dialógicas, exigiu o reconhecimento
do “outro” como indivíduo
dotado de uma formação
cultural própria, rompendo com o olhar apenas das condições objetivas, dando espaço
para a subjetividade individual como elemento da autonomia.
3.
Aplicação do conhecimento. Momento de sistematização
das práxis, a partir da realidade
concreta e da reflexão crítico-teórica, com vistas a propiciar condições
para a ressignificação dos currículos e das práticas no interior dos espaços
escolares. O respeito às
narrativas das escolas foi um dos principais elementos que colaboram para a constituição da autonomia dessas instituições.
Toda a formação alicerçou-se na pesquisa-participativa, aquela que coloca os indivíduos na condição de pesquisadores da própria prática. Tal perspectiva possibilitou aos professores refletir sobre a sua ação individual e coletiva, estimulando o diálogo e a troca, permitindo: problematizar concepções; rever ações, por vezes, cristalizadas; aprofundar os conhecimentos em relação ao desenvolvimento dos processos de aprendizagem e às especificidades das culturas infantis, dos adolescentes e dos jovens e adultos; conhecer o entorno das escolas, sua história, dificuldades e potencialidades, ademais de situar as discussões educacionais numa esfera macro para compreensão das contradições do contexto escolar, como resultante das práticas sociais.
A primeira iniciativa do NAE, da região de Santo Amaro-Capela do Socorro- Parelheiros, consistiu em chamar as equipes gestoras das escolas para apresentação das diretrizes pedagógicas da Secretaria, seguida da leitura do documento EducAção nº 01, chamamento que fomentou o discutir a realidade das escolas, seus desafios e o Projeto Políticos-Pedagógico (PPP)[7] de cada unidade escolar já em curso.
Ao longo dos três primeiros meses, num primeiro estudo de realidade, foram realizados encontros com os gestores escolares, sendo com eles produzidas pautas conjuntas, vinculando os GAAEs às escolas, numa construção compartilhada do projeto de formação em serviço que se pretendia.
Os diretores e coordenadores tornaram-se, assim, partícipes das ações formativas do GAAE 6, dinamizavam as discussões nos ambientes escolares, a partir de proposição de atividades de formação docente, construindo um processo contínuo de ação-reflexão-ação. Acompanhando a aplicação das atividades com o grupo de docentes, esses gestores, reviam o planejamento de ações educativas e ressignificavam o Projeto Político-Pedagógico institucionalmente produzido nos anos anteriores.
A ação formativa focou-se, ainda, nas histórias de vida dos profissionais, tornando-as “gatilho” do acompanhamento da ação educativa em cada grupo. Para os formadores, foi essencial retomar a trajetória pessoal e profissional dos educadores; mais do que conhecê-los, era preciso reconhecê-los enquanto indivíduos detentores de subjetividades, histórias, crenças e convicções.
Os procedimentos de formação
seguiam como estrutura: observação, registro, reflexão, síntese, avaliação e planejamento; considerando as falas dos educadores, fontes de investigação; e, tematização, identificando conceitos
e concepções que submergiam
das práticas, evidenciando contradições
discursivas, que, tornadas conscientes, permitiam autorreflexão e teorização. favorecendo a revisão das ações instituídas.
A cada encontro, um dos profissionais, escolhido no anterior encontro, fazia uma “leitura compartilhada” com o sentido de “presentear” aos parceiros com uma situação agradável, evidenciando ler como ação dialógica que amplia o significado para o outro; um dos participantes fazia o registro das reuniões, sua dinâmica, tensões e desafios, também em alternância. Dessa forma, leitura, observação, escuta atenta e registro iam se tornando elementos do próprio processo formativo.
Apesar da atuação do GAAE aparecer vinculada à formação em serviço dos professores, a programação foi estendida a toda comunidade escolar em diversas ações, como articulação de grupos de pais, tais como o “Grupo de pais contadores de histórias” que atua, ainda hoje, na região do CEU[8] Navegantes, e, grupos formativos do quadro operacional e técnico. O programa incluiu, também, cursos, palestras, oficinas, simpósios, debates, visitas monitoradas, formação artístico-cultural, entre outras iniciativas.
As diferentes modalidades formativas procuraram dar suporte à implantação do Projeto Político-Pedagógico da SME/SP. Partiram do pressuposto de que a consecução de uma escola pública de qualidade (social), passa pela autonomia e emancipação dos seus atores. Apesar de se ocupar com diferentes modalidades de formação em serviço, nunca se perdeu o locus na escola e a finalidade de, explicitando os conceitos que orientavam as práticas e as relações sociais escolares, promover a autonomia e elevar as possibilidades de emancipação, pela escuta, participação efetiva nas decisões no âmbito escolar e no planejamento do próprio percurso formativo, ademais da construção coletiva de referenciais que respondam às necessidades locais, tecendo a escola como objeto de análise, de aprofundamento teórico e de reorientação de práticas, num movimento constante de ação-reflexão-ação.
Como em todo processo humano, a presente experiência trouxe, em si, contradições, sendo que, dentre os grandes desafios daquele GAAE (formar-se enquanto formador; formar os profissionais em serviço; promover autonomia, mantendo o lócus na escola e fazer caminhar lado a lado a teoria e a autorreflexão da experiência.). O principal foi vencer a eventual resistência de profissionais em participar. Poucas vezes como um resistir teórico, porque os debates se transformaram em troca de pontos de vista, estimulando o livre pensar, não entraves, apenas compartilhamento de anseios, medos e dúvidas com liberdade, confiança e corresponsabilização, valorizando a autonomia docente no convívio com as diferentes possibilidades do fazer pedagógico.
Alguns profissionais tiveram uma postura contra a própria ação formativa na escola, declarando identificar o GAAE como parte da administração municipal, aparentemente, em função do histórico das disputas políticas regionais e da substituição de Secretários da Educação, Coordenadores dos NAEs, desmembramento desses núcleos em coordenadorias, entre outros fatores.
O clima de rotatividade de lideranças políticas nos setores
estratégicos da SME/SP e nos órgãos intermediários de poder
educacional, bem como as lutas
políticas locais (embora,
por vezes, distantes de cada instituição
escolar) projetaram-se sobre a formação
em serviço. Alguns que, em meio à correlação de forças, tinham perdido ou divergiam das escolhas de cargos ou
prioridades, se manifestaram eventualmente de forma
clara: “Nós sabemos da seriedade
do trabalho de vocês, mas, vocês sabem né.
Nosso problema é com a administração, com vereador X, Y, Z...”; “Olha desculpa tá, mas a gente vai pra cima de vocês, nada pessoal, é coisa de política.”, outros
de forma mais velada, mas sempre cortando o caminho do
diálogo, fazendo do GAAE e seus
membros configuração
política e ideológica das batalhas de poder travadas na região.
O impacto dessa ciranda de poder na Secretaria de Educação também ocasionou perdas objetivas ao conjunto dos GAAEs, interrompeu parcerias com as Universidades e desviou a formação em serviço para outras rotas menos inseridas nas práticas sociais da escola, desmontando processos em curso. A gestão da Secretaria da Educação foi, também, refém de disputas que interferiram no cotidiano dos NAEs. Assim, as trocas de cadeiras e de pastas alimentaram regressões:
Em 2002, o Secretário Fernando José Almeida deixou a Secretaria, sendo substituído por Eny Maia; processo que redundou no congelamento das ações iniciadas, embora o eco em cada NAE tenha sido diferente, em função de suas particularidades. Em agosto desse mesmo ano, a Lei Municipal nº 13.399/02 autorizou a criação das trinta e uma subprefeituras e cada subprefeitura com coordenadorias, inclusive de educação, objetivando atender aos três princípios estruturantes da administração naquele momento: descentralização, participação e autonomia.
Como consequência, os NAES foram transformados de Educação, sendo o NAE de Santo Amaro-Capela do Socorro - Parelheiros, no qual a experiência descrita decorreu, desmembrado em quatro Coordenadorias: Capela do Socorro, Cidade Ademar, Santo Amaro e Parelheiros. Esse desmembramento fez avançar quando diminuiu as escolas de atuação dos GAAEs, mantendo regredida a tendente descontinuidade das políticas públicas em todo o país até hoje, fragmentados em várias coordenadorias, sem continuidade dos vínculos estabelecidos anteriormente.
Em 2003, a Secretaria da Educação foi assumida pela socióloga Maria Aparecida Perez, retomando as diretrizes de 2001, mas os NAEs, fragmentados, não conseguiram responder e manter os vários projetos, desarticulando, igualmente, os GAAEs. Em 2005, a nova administração municipal eleita desligou os profissionais, em seus novos projetos, desconsiderou a história de formação em serviço, ora apresentada, instaurando uma política educacional distanciada das reais necessidades das escolas.
A experiência vivida por uma das autoras junto à Secretaria Municipal de Educação de São Paulo da qual resultou este relato, levou a refletir sobre as categorias, emancipação e a autonomia como fundamentos desse processo de formação docente em serviço. Tais categorias aparecem em força na análise social que emana da Teoria Crítica da Escola de Frankfurt, especialmente, Adorno e Horkheimer (1975 e 1986) e estão presentes no pensamento de Paulo Freire. Reconhecendo que, entre os dois referenciais teóricos, há desencontros e distanciamentos que não cabem no presente trabalho, este relato, discute avanços e regressões no experimentado, a partir dos dois referenciais.
Com uma análise rigorosa do “desenrolar histórico” (Adorno; Horkheimer, 1975), a Teoria Crítica lê a sociedade capitalista a partir da dialética, do avanço e da regressão nas relações sociais vigentes rumo a processos emancipatórios e ainda que apresente uma aversão aos sistemas filosóficos fechados, tem no materialismo histórico dialético seu arcabouço[9] como destaca Pucci (1994):
[...] não se apresenta como uma teoria autônoma, acabada, quese propõe a substituir ou suplantar o materialismo histórico. Antes, ela só é entendida nos horizontes do materialismo histórico como um conjunto de propostas teóricas que visa contribuir para a atualização, revitalização do marxismo, a partir de novos desafios que o mundo ocidental contemporâneo suscita (Pucci, p.55).
Podemos situar que o materialismo histórico, igualmente, ponto de partida de Paulo Freire na análise das relações sociais entre oprimidos e os opressores somado à presença do existencialismo cristão que “[...]aparece nos escritos de Freire em íntima conexão com o historicismo e o culturalismo, surgindo igualmente ao lado de uma influência mais ou menos difusa do hegelianismo”, como Paiva (1986, p.77) destacou, que coloca a emancipação como categoria chave, ora pendente para um emancipar pela força da classe social, ora do próprio sujeito que avança na sua consciência histórica.
Assim, é possível ver a coincidência de referências fundamentais à Teoria Crítica, em especial Adorno (1975, 1986 e 1995) e Freire (1979/2005), observando que ambos irão destacar o papel da educação na transformação social emancipação humana, atuando, inclusive e principalmente, sobre relações concretas que se estabelecem na esfera educativa, entre os sujeitos e desses como conhecimento e a realidade, tendo por princípio a constituição de indivíduos autônomos.
A experiência narrada incorpora de Freire (1979a) a função permanente de emancipar pela conscientização. Ora, a formação situada na escola apresenta potência para alterar transformação nas relações institucionais e modificar a relação entre sujeitos e o conhecimento e realidade sociocultural na qual se inserem pela crítica reflexiva que se promoveu junto aos profissionais participantes, incorporando, para tal a eminência política da educação que Freire defendeu ao longo de sua trajetória.
Paulo Freire interpreta a educação como elemento da formação humana inacabada, que tornada consciência, pode apresentar possibilidades de emancipação:
O caminho da emancipação humana está no resgate da humanização nos contextos sociais, em comunidades reais, nos sujeitos, construindo uma ação pedagógica [...] que faça da opressão e de suas causas objeto da reflexão dos oprimidos, de que resultará o seu engajamento necessário na luta por sua libertação, em que esta pedagogia se fará e refará. (Freire, 1979b, p.34)
A categoria emancipação em Paulo Freire (2002 e 2006) representa a defesa de um compromisso da educação com emancipar aos oprimidos do poder opressor que, por não ser neutro, carrega conteúdo político para a via da conscientização; aquela que permite ao homem assumir o seu papel de sujeito que faz e refaz o mundo numa práxis social libertadora, aguça a consciência de classe e o engajamento político, rompe com a reprodução às condições de dominação porque “[...] conscientizar é politizar.” (Freire, 2005, p. 22.).
Na formação em serviço, promovida pelo GAAE 6, a problematização de realidades locais para aplicar conhecimento e repensar o fazer pedagógico, representou um processo de tomada de consciência política do papel de instituição escolar e de cada profissional, que, no artifício de sua própria emancipação se tornou de contribuir com a emancipação do outro e do grupo que compõe a escola.
Foi essa emancipação possível no modelo de sociedade vigente, compromisso também preconizado por Adorno (1995) para a educação que, nesta experiência de apropriação da realidade escolar como espaço reflexivo que contribuiu para desvendar da contradição entre o esclarecimento e barbárie como:
[...] impulso de destruição, que contribui para aumentar ainda mais o perigo de que toda esta civilização venha a explodir, aliás uma tendência imanente que a caracteriza. Considero tão urgente impedir isto que eu reordenaria todos os outros objetivos educacionais por esta prioridade (Adorno, 1995, p. 155).
Compreendendo que a efetivação da educação reside na promoção de um homem esclarecido, capaz de avançar na promoção da emancipação dos sujeitos, rompendo com a ideologia através da autorreflexão crítica que dirija as ações no sentido de não afirmar a lógica do capital, produzindo consciência emancipada “[...] trabalhando a autorreflexão de modo transparente e em sua finalidade humana [...]” (Adorno, 1995, p.161) a atuação do GAAE 6 contribuiu para a desbarbarização dos profissionais envolvidos que, munidos do contexto escolar, construíram elementos para assumir possibilidade de ir além da:
[...] chamada modelagem de pessoas, porque não temos o direito de modelar as pessoas a partir do seu exterior; mas também não a mera transmissão de conhecimentos, cuja característica de coisa morta já foi mais do que destacada, mas a produção de uma consciência verdadeira. Isto seria inclusive da maior importância política; sua idéia [de H. Becker – NV], se é permitido dizer assim, é uma exigência política. Isto é: uma democracia com o dever de não apenas funcionar; mas operar conforme seu conceito demanda pessoas emancipadas. Uma “democracia efetiva só pode ser imaginada enquanto uma sociedade de quem é emancipado. (Adorno, 1995, p. 141-142).
A emancipação é tratada por Adorno (1995) como categoria dinâmica; emancipar-se remete a um interesse oposto ao da técnica instrumental que reproduz a lógica capitalista. Nesse sentido está imbricada com a autonomia. Para o pensador, a construção da autonomia também conota resistência à barbárie, como superação da heteronomia abre espaço para um “esclarecimento” dialético que permita afrontar a perda da subjetividade do indivíduo no desvelamento das contradições sociais.
Esse conceito de autonomia, com raiz no inverso da “[...] menoridade [do indivíduo], da qual ele próprio é culpado” (Kant, 2010, p. 63) pensar e agir sem a tutela de outrem, superando um mundo administrado e competitivo que produz apenas progresso técnico e ameaça aprisionar o pensamento aos fins emanados do sistema, foi um marco do GAAE 6, durante toda a relação estabelecida com os profissionais. Estabeleceu-se cooperação como forma de reforças aos vínculos entre os pares e promover o compromisso com os alunos e as famílias.
Assim, a iniciativa formativa aqui descrita, motor do processo de formar docentes, investiu num caminho que pretendeu não permitir o se esvair nas tramas da racionalidade técnica para promover uma formação cultural a mais ampla possível, mesmo considerados os limites no interstício das contradições sociais que fazem avançar e mantêm regredida a sociedade e a escola.
A autonomia do sujeito em Freire (2005) reside na possibilidade de fazer escolhas que, segundo o educador, devem ser movidas pela necessidade de rompimento com toda forma de violência (física ou simbólica) que aprisiona as pessoas, condicionando-as a perpetuar o modelo social vigente; afirma a autonomia como elemento do processo dessa conscientização, fomentando a característica humana passível de efetivar a curiosidade epistemológica.
No desenvolvimento do projeto que o GAAE 6 fez, como se descreveu anteriormente, envolveu os profissionais em ações de análise e crítica que permitiram uma “consciência do mundo e [...] de si como ser inacabado necessariamente inscrevem o ser consciente de sua inconclusão num permanente movimento de busca”. (Freire, 2005, p.p. 63-64), cuja ação circula entre conhecer a realidade, agir no campo escolar e repensar a prática cotidianamente, estimulou a vontade de pesquisa permanente nos espaços escolares, problematizando-os.
Transversal à autonomia e a emancipação, a categoria da conscientização em Paulo Freire (2010) e a de autorreflexão em Adorno (1995) aparecem com relativa convergência, na medida em que representam aspecto fulcral da emancipação pela educação nos dois autores.
Freire (2010) contrapõe duas formas de relação do sujeito com a compreensão da realidade que influenciam a sua ação, na medida em que a natureza do agir corresponde à do compreender: tomada da consciência e a conscientização. A primeira envolve uma aproximação espontânea com a realidade, assimilação de dados e causalidades, gerando visões ingênuas do real, enquanto a segunda é um processo de superação da esfera espontânea de apreensão da realidade, atingindo uma esfera crítica, na qual a realidade se dá como objeto cognoscívelpara ohomem, o apodera como transformador, porque “[...] a realidade não pode ser modificada, senão quando o homem descobre que é modificável e que ele pode fazê-lo.” (Freire, 2001, p.32).
Conscientização foi um conceito concebido por Freire nos anos de 1960, em conjunto com grupo de professores do Instituto Superior de Estudos do Brasil (ISEB) que se refere à descoberta da modificabilidade da realidade pela ação humana.
Como já se argumentou, as práticas formativas do GAAE 6, representaram esse movimento entre o pensar e o agir, que situa conceito de práxis, unidade dialética - que se movimenta na ação-reflexão-ação, na medida em que, para o autor: “Ao oprimido não basta saber-se oprimido; mas a conscientização deve inseri-lo em um processo de transformação da realidade.” (Oliveira; Carvalho, 2007) num ir e vir da realidade escolar, carregando a reflexão sobre o real mediado, então, pela discussão teórica e aprofundamento.
Esse conceito de consciência aparece com significado de autorreflexão para a Teoria Crítica, que considera impossível a emancipação social sem a modificação do indivíduo que, desprendido dos condicionamentos impostos pelo social. A formação em serviço promovida pelo GAAE 6 carregou essa reflexão, contribuindo para elevar a capacidade crítica e trazer à luz as incongruências, contradições e barbáries presentes na sociedade resistência porque “[...] a autorreflexão e o esforço crítico são dotados [...] de uma possibilidade real.” (Adorno, 1995, p.69).
A experiência vivida entre 2001 e 2004 na Rede Municipal de Educação de São Paulo, ora refletida no presente relato, a despeito das idas e vindas das políticas de educação do município, foi um marco situado na contramão dos projetos reformistas que marcaram o campo educacional brasileiro desde sempre, cuja lógica se alicerça em determinações normativas, prescrições e controle, numa relação de poder verticalizada, relegando à escola e aos seus sujeitos o papel de cumpridores de currículos instituídos.
Foi uma ação promotora do diálogo entre a Secretaria, Núcleos de Ação Educativa e as unidades escolares, aproximando órgãos centrais da realidade escolar que promoveu autonomia do coletivo de cada escola, favoreceu o estabelecimento de compromissos políticos para a constituição de um projeto de educação pública- emancipatório no sentido apontado por Paulo Freire.
Apropriando-se da perspectiva da Teoria Crítica, foi âncora de ações educativas autônomas das escolas e, ao formar professores em serviço, longe de reproduzir o igual, vislumbrou, na diferença, respostas às vicissitudes de cada contexto, sem descuidar do processo permanente de reorientação curricular rumo à formação cultural plena do indivíduo.
Ao aumentar a autonomia dos profissionais, fez-se avançar possibilidades de ultrapassar a “[...] racionalidade do sempre-igual. Onde a experiência é bloqueada ou simplesmente já não existe” (Adorno, 1995, p.204), valorizando uma experiência verdadeira e estimulando a resistência à destituição das individualidades dos sujeitos e das particularidades das escolas, impostas nas políticas educacionais anteriores e subsequentes no município. O fomento à autorreflexão com lócus na escola, contribuiu para desvelar opções para o enfrentamento daquilo que pode aprisionar estudantes, professores e comunidade local: a resposta igual a todas as situações escolares e a não promoção da equidade.
Enfim, o processo dessa formação em serviço, ampliou práticas reflexivas, promovendo percursos emancipatórios ao romper com verdades estabelecidas que reduzissem a ação curricular a mero instrumento técnico, transformando-a em razão instrumental. As práticas formativas, alicerçadas nos problemas que os próprios educadores visualizam e problematizadas criticamente[10], podem tornar-se potenciais de novos fazeres e reflexões.
Tal movimento de negação a uma política homogeneizante e “enformadora” revelou as possibilidades de avanços presentes no limite do que se mantém regredido. Como toda experiência social, os avanços trazem em si elementos de regressão.
Destacamos que os limites enfrentados pelos NAEs, pelos GAAEs, pelas escolas e pela própria Secretaria
de Educação, como apontado
anteriormente, promoveram um
descompasso entre a forma que as diferentes unidades
escolares, em seu processo
histórico, absorveram a formação
em serviço, nem sempre se libertando das amarras do modelo prescritivo, opondo resistência à autorreflexão sobre
as práticas e alternativas de mudança,
mas também demonstrou a importância de,
“[...] pensar [ como ] o mesmo que fazer experiências intelectuais. Nessa medida e nos
termos que procuramos expor, a educação
para a experiência (formativa) é idêntica
à educação para a emancipação.
” (Adorno, 1995, p.150-151).
O presente relato situa a formação em serviço na prefeitura de São Paulo entre 2001-2004 no campo da experiência (Adorno; Horkheimer, 1975, p. 142), compreendida como a possibilidade de transformação, a partir do processo de autorreflexão sobre uma realidade histórica.
A experiência como formadora de uma das pesquisadoras e a discussão do experimentado, entre as duas autoras do presente texto, estendeu a reflexão, considerando as perspectivas de Paulo Freire e Adorno, em torno das categorias emancipação, considerada fundamento da própria formação humana e a autonomia, como princípio necessário a todo processo formativo, especialmente o de professores.
A presente experiência, apesar de seu limitado escopo, a formação em serviço em um único GAAE e na imensidão da Rede Municipal de Educação de São Paulo, permite verificar que esse tipo de ação formativa pode potencializar a autonomia e a emancipação no cruzamento entre a forma que esses conceitos são referenciados pelos autores referidos.
Apesar dos conflitos e contradições presentes no percurso formativo que, nem sempre, levou a novas práticas,foi um movimento que ampliou possibilidades de trilhar caminhos capazes de romper com a heteronomia e com a padronização que homogeneíza, não apenas os currículos, mas a ação docente, aprisionando-os em padrões predeterminados e deslocados da realidade, em que as escolas e seus indivíduos estão inseridos, inviabilizando, com isso,quaisquer alternativas de autonomia e emancipação pela via formativa.
No exercício profissional de educadores, os formadores viveram uma experiência possível de afirmar um avançar de sua emancipação, ampliando a autorreflexão e a reflexão conjunta. Continuam, até hoje, resistindo a qualquer padronização que reduza a ação educativa a mera questão técnica ou ao microuniverso escolar, compreendendo-o para além das disputas político- partidárias.
Nas várias funções educativas que foram assumindo nas escolas, esses profissionais fomentam condiçõespara a apropriação autorreflexiva dos docentes e dos gestores sobre o currículo e as relações escolares;discutem, também, com os órgãos intermediários e publicamente, a necessidade de uma formação em serviço queultrapasse modelos arbitrários de currículo e de instituição escolar, desenvolvendo projetos de formação cultural de cada e de todos os atores e provendo experiências capazes de elevar a emancipação, sem perder de vista que o locus da formação em serviço dos docentes na escola, sempre embebida pela realidade social que a compõe.
Igualmente, os docentes, que participaram da formação em serviço exposta, puderam experimentar um exercício autônomo de formar-se pela autorreflexão, a partir do que conhecem para avançar num diagnóstico amplo da escola no meio social para fundamentar as suas intervenções educativas que avancem a compreensão do real pelo conjunto dos atores.
Esses sinais ainda presentes nos profissionais e nas escolas, em seus Projetos Político-Pedagógicos, mantêm vivos os esforços em favor da construção de uma escola mais ao encontro do seu sentido público e em busca de relações diferenciadasede um currículo includente como resultado possível da formação em serviço empreendida.
Há mais de uma década do experimentado, reconhecem-se avanços conquistados naquele movimento histórico, especialmente essa aposta autorreflexiva no interior da escola e seu potencial emancipador. Em meio aos avanços, também há regressão, por exemplo, a rápida adesão, por parte de muitos profissionais, aos modelos prescritivos reimpressos posteriormente. A experiência apresentada possibilitou, como se demonstrou, trabalhar um conteúdo aberto, não doutrinário, dialógico como defende Paulo Freire (2002) e emancipador, no caminho que advoga Adorno (1995).
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[1] Lucilene Schunck Costa Pisaneschi compôs o Grupo de Acompanhamento da Ação Educativa (GAAE) do Núcleo de Ação Educativa (NAE) da região de Santo Amaro-Capela do Socorro- Parelheiros entre 2001 e 2004 junto à Prefeitura de São Paulo onde trabalha desde 1999, desenvolvendo o projeto “Oficinas Pedagógicas”.
[2] Os GAAEs foram grupos de trabalho criados com foco na formação em serviço de professores e com membros das escolas e das diretorias de ensino ( órgãos regionais de gestão educativa da Secretaria Municipal de educação)
[3] A “Reorientação Curricular” foi um projeto desenvolvido entre 1989 e 1993 que rediscutiu o currículo municipal com o conjunto das escolas.
[4] Diretorias Regionais de Educação denominadas, naquele período, Núcleo de Ação Educativa – NAE.
[5] Esse é o caso, por exemplo, da parceria firmada com a PUC-RJ através da assessoria das professoras Sônia Krammer e Patrícia Corsino.
[6] Os GAAEs desse NAE trabalhavam diretamente com 4920 educadores, 82% do total, sendo, 1188 educadores dos Centros de Educação Infantil (CEI); 1377 professores das Escolas Municipais de Educação Infantil (EMEI) e 2355 das Escolas Municipais de Ensino Fundamental (EMEF).
[7] O PPP é um documento formulado pelas escolas de toda a rede municipal de São Paulo que resultou de discussões amplas com toda a comunidade escolar, definindo objetivos e ações a partir das realidades identificadas. Esse tipo de planejamento participativo é indicado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9394\96
[8] Centro de Educação Unificado, espaço que contava com vários equipamentos educativos e de lazer no seio dos bairros paulistas.
[9] A Teoria Crítica traz em seu bojo, também, uma ampla influência do pensamento de Kant, Hegel, Marx, Freud, Weber e Lukács.
[10] O processo de problematização das práticas demanda o desvelamento social em que estas ações estão inseridas, colocando o contexto social e seus limites sob o olhar crítico-analítico. O esclarecimento necessário para esse desvelamento pauta-se, tanto para Freire como para Adorno, na denúncia dos mecanismos de dominação e no compromisso político assumido, pela escola de massas, em prol de uma sociedade menos injusta, dominadora e violenta.